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O real cenário das Diretivas Antecipadas de Vontade no Brasil: cinco anos da Resolução CFM nº 1995.



Depois de conhecermos um pouco sobre as Diretivas Antecipadas de Vontade (DAV), no texto desta semana nos propomos a analisar o panorama da aplicação do instituto no Brasil, cinco anos após o início da vigência da Resolução n° 1995/2012 do Conselho Federal de Medicina, única e incipiente tentativa de regulação das DAV no país.


Ao longo da nossa série de textos, constatamos que a morte e o fim de vida ainda são assuntos tabus em nossa sociedade, e este é um relevante fator que contextualiza e explica o motivo de que, entre os anos de 2012 e 2016, apenas 672 documentos contendo as Diretivas Antecipadas de Vontade foram formalizados – segundo dados do Colégio Notarial do Brasil.¹ Sendo que deste total, apenas 26 foram registrados no estado de Minas Gerais. Além do mais, o desconhecimento da população em geral sobre o instituto, contribuem para os números, uma vez que a sua discussão tem sido restrita ao ambiente acadêmico e, em menor proporção, aos conselhos de ética médica.


Outro motivo da baixa efetividade das DAV no Brasil é desconhecimento do instituto por parte dos próprios profissionais da saúde, e em especial os médicos, apesar da regularização do instituto partir do seu próprio Conselho de classe. Relata-se, inclusive, a resistência dos profissionais em aceitar e reconhecer a validade do instituto quando este lhes é apresentado por um paciente. Talvez esse quadro seja uma consequência direta da ausência genérica da formação e preparação dos profissionais da saúde para dialogar com seus pacientes acerca do fim de vida.


Com certeza o maior obstáculo à efetivação das DAV reside na ausência de legislação específica que as regule. É fundamental a compreensão de que a Resolução do CFM é insuficiente para regularizar todas as peculiaridades que o instituto necessita², tendo em vista que este deve ser um instituto jurídico e não médico.


Além do mais, a falta de legislação impede, muitas vezes, a validade prática das poucas diretivas confeccionadas, visto que a insegurança jurídica da lacuna legislativa temoriza o profissional da saúde quanto ao enfrentamento de processos judiciais em decorrência do cumprimento de vontades do paciente como o pedido de não reanimação cardiorrespiratória; especialmente, porque os desejos da família estão, quase sempre, desalinhados com os do paciente que faz esse tipo de escolha, e esse é um conflito que advém diretamente da falta de diálogo sobre o assunto.


Frente a esse panorama, nos parece claro que as Diretivas Antecipadas de Vontade, ainda recém nascida no Brasil - mas que já caminha para a primeira infância -, carece da devida efetividade que a seriedade do instituto lhe exige. A necessidade de nos próximos anos colocar em vigor legislação que trate de suas peculiaridades, será determinante para seu sucesso no país. Até lá, espera-se que o assunto seja cada vez mais difundido e discutido, pois é questão fundamental para a dignidade do fim de vida e indispensável para a concretização do projeto existencial de cada ser humano.



Referências bibliográficas:


DADALTO, Luciana. A implementação das DAV no Brasil: Avanços, Desafios e Perspectivas in DADALTO, Luciana. Bioética e diretivas antecipadas de vontade. Curitiba: Prismas, 2014.


Informações acerca do número de Testamentos Vitais lavrados no Brasil. Disponível aqui.

  1. Há de que se ressalvar, no entanto, que as DAV não precisam estar registradas em cartório para que adquira validade, o instituto não carece de formalidades.

  2. Resoluções do CFM não se confundem com legislação. A Resolução n° 1995 apenas conceitua as DAV e dispõe sobre alguns procedimentos que devem ser tomados pelo médico frente ao instituto. Uma legislação específica se faz necessária para uma melhor disciplina do instituto: orientando os procedimentos de sua confecção, de registro (ou dispensando-o expressamente), determinando a criação de um banco de dados em que as Diretivas de um paciente estejam disponíveis para consulta em qualquer hospital do país e até dispondo sobre as possíveis sanções do profissional que deixar de cumpri-las.




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